MPF denuncia 37 envolvidos em esquema de corrupção no Distrito Federal

Durval Barbosa
Durval Barbosa: de corruptor a delator

BRASÍLIA [ ABN NEWS ] — O Ministério Público Federal denunciou nesta sexta-feira, 29 de junho, 37 envolvidos no esquema de corrupção no Distrito Federal que ficou conhecido como Caixa de Pandora. Entre eles está o ex-governador do DF, José Roberto Arruda, o ex-vice-governador, Paulo Octávio; o conselheiro do Tribunal de Contas do DF, Domingos Lamoglia; o delegado de Polícia Civil aposentado, Durval Barbosa; e ex-deputados distritais. Eles são acusados pelos crimes de quadrilha, corrupção passiva, corrupção ativa e lavagem de dinheiro.

De acordo com a peça, assinada pelo procurador-geral da República, Roberto Gurgel, e pela subprocuradora-geral da República, Raquel Dodge, pelo menos 19 dos denunciados associaram-se, entre o início de 2006 e abril de 2010, para montar “um sofisticado estrategema de corrupção e de desvio de recursos públicos no Distrito Federal, entranhando-se na estrutura administrativa e de governo com a finalidade de cometer crimes para financiar atividades ilícitas, conquistar e manter o poder político e enriquecer seus membros e aliados.” Arruda era o líder e Durval Barbosa o operador financeiro.

Mas a formação da quadrilha se iniciou antes mesmo da posse de Arruda no governo, quando ele ainda era deputado federal, com apoio de Joaquim Roriz. O esquema consistia em solicitar a empresários que prestavam serviços de informática ao Governo do Distrito Federal (GDF) recursos para financiar as atividades do grupo. Em troca, prometia-se contratações com o GDF, que eram viabilizadas com o apoio de Durval Barbosa. Durante a campanha de Arruda, em 2006, o dinheiro foi usado para compra de base de apoio político, evitando também que o apoio financeiro da empresas migrasse para a campanha de candidatos concorrentes.

Com a posse de Arruda e Paulo Octávio, a denúncia afirma que a quadrilha “apropriou-se do Estado como se fosse coisa privada”, mantendo-se ativa e influente. “A partir de 2007, como fez antes, a quadrilha favoreceu ilicitamente empresários, corrompeu parlamentares distritais e representantes de partidos políticos, enriqueceu ilicitamente seus membros e colaboradores, e garantiu poder político e econômico aos integrantes do esquema criminoso. Foi eficiente em perturbar a paz social e corromper o tecido público e social, graças à atuação deliberada, eficiente e irrefreada de seus membros, ora denunciados”, relata a peça. Todo o esquema, que só foi desarticulado com a prisão de Arruda, contrastava com discurso de austeridade, obras e resultados do GDF, que teriam o fim de desviar a atenção das fraudes em contratações.

Modo de operar – O modo de operar da quadrilha era o seguinte: os secretários de estado e demais titulares de órgãos e entidades da Administração Pública do GDF e seus ordenadores de despesa reconheciam as dívidas de exercícios anteriores por prestação de serviços das empresas de informática, sem indicar até quando no passado. O pagamento dessas dívidas era feito com recursos públicos provenientes de dotações orçamentárias dos órgãos e entidades do GDF.

Todo esse esquema de corrupção foi legitimado por um decreto do então governador José Roberto Arruda (decreto nº 30.072/2009). O reconhecimento de dívida é admitido em lei, mas para casos excepcionais. Com o decreto do GDF, entretanto, tornou-se regular, favorecendo os interesses da quadrilha.

Sob a aparência de legalidade, os gestores elevaram o reconhecimento e o pagamento de dívidas das empresas de informática em valores que ultrapassaram 500% o valor pago às mesmas empresas em 2008, sob o mesmo título. Entre 2005 e 2010, o GDF pagou aproximadamente R$ 110 milhões a título de reconhecimento de dívida por prestação de serviços, sem cobertura contratual, em favor das empresas citadas. Para se ter uma ideia, a Linknet recebeu em 2008 cerca de R$ 8 mil como reconhecimento de dívidas e em 2009, esse valor subiu para R$ 40 mil.

A partir do reconhecimento da dívida, a partilha era feita com a quadrilha. O operador financeiro do grupo e responsável pelo recebimento da propina e o controle e distribuição dos valores arrecadados era Durval Barbosa. A mando de Arruda, ele solicitava e arrecadava entre 7% e 10% do total líquido pago pelo GDF às empresas envolvidas no esquema. Desse valor solicitado, 40% era destinado a Arruda, 30% a Paulo Octávio, 20% ao secretário da pasta que reconheceu a dívida e cerca de 10% ficava à disposição de Arruda, para a corrupção de parlamentares, representantes de partidos políticos ou outra finalidade de interesse do grupo.

O MPF analisou 106 termos de reconhecimento de dívidas e processos de pagamentos feitos pelo GDF às empresas Linknet, Adler, Call Tecnologia, Vertax, CTIS, Conecta e Unirepro. Esses casos correspondem somente ao que foi possível acessar até o momento do fechamento da perícia realizada pelo Ministério Público Federal.

Os maiores valores foram pagos às empresas Linknet (R$ 40,5 milhões) e Adler (R$ 8,3 milhões), que passaram a ser as principais empresas de informática abastecedoras do esquema montado pela quadrilha. No GDF, a secretaria que mais utilizou o reconhecimento de dívida entre 2008 e 2009 foi a Secretaria de Planejamento e Gestão, cujo titular era Ricardo Penna. Essa secretaria foi responsável por quase 88% do reconhecimento de dívida para o esquema.

José Roberto Arruda, líder da quadrilha, mantinha o controle do esquema e a prestação de contas a ele era minuciosa, com pormenores dos valores a serem recebidos das empresas e pagos aos envolvidos. Também era parte do esquema a “mesada” aos deputados distritais denunciados, que foi estimada como algo em torno de R$ 600 mil para esse grupo.

O Ministério Público Federal pede, entre outros requerimentos, que a sentença condenatória inclua a obrigação de indenizar o danos causado pelos crimes, ou seja, a devolução do dinheiro desviado. Pede também que os produtos e bens auferidos com o crime, ou seja, os bens e valores apreendidos, sejam repassados à União. E solicita os benefícios penais decorrentes da delação premiada a Durval Barbosa.

Detalhes sobre a divisão de tarefas do esquema e o relação de denunciados

Divisão de Tarefas

Segundo a denúncia, José Roberto Arruda, Paulo Octávio Alves Pereira, Durval Barbosa Rodrigues, Joaquim Domingos Roriz e mais 15 acusados formavam uma “quadrilha com vínculos estreitos, firmes, permanentes e estáveis entre si”. A peça processual define os objetivos da prática: 1)
implementar um projeto de poder político que garantisse acesso direto ao dinheiro público para desviá-lo e apropriá-lo mediante corrupção; 2) assegurar o enriquecimento ilítico dos membros, mediante lavagem de dinheiro; 3) pagar vantagem financeira a deputados distritais, a fim de constituir a base política do novo Governo do Distrito Federal (GDF) dentro da Câmara Legislativa e garantir votos favoráveis a projetos de lei de interesse do grupo.

A estrutura da quadrilha era dividida em cinco núcleos, com divisão de tarefas de acordo com a hierarquia. A partir de 2007, o Núcleo Dirigente passou a ser integrado por José Roberto Arruda e Paulo Octávio Alves Pereira, eleitos governador e vice-governador do Distrito Federal,
respectivamente. Para o MPF, Arruda se tornou o líder da quadrilha e Paulo Octávio Alves Pereira, o segundo no comando.

Conforme demonstra a denúncia, os dois políticos definiram o plano para domínio da máquina pública distrital. Inicialmente, indicaram membros da quadrilha para ocupar postos chaves da administração do GDF. Arruda e Paulo Octávio coordenavam as ações dos subordinados, como a
designação das tarefas e a idealização e controle de todos os atos administrativos e privados que viabilizavam o pagamento de verbas públicas.

O Núcleo Coordenador e Gestor dos Atos Administrativos era formado por Arruda, Durval Barbosa, José Geraldo Maciel, Ricardo Pinheiro Penna, Roberto Eduardo Ventura Giffoni, José Luiz da Silva Valente, Fábio Simão, Gibrail Nabih Gebrim, Adailton Barreto Rodrigues, Masaya Kondo e Luiz
Cláudio Freire de Souza França, responsáveis pela edição de atos administrativos que dissimulavam a atuação do grupo. Um exemplo era a dispensa e a fraude de licitação, com o objetivo de contratar empresas envolvidas no esquema ilícito. Os contratos dependiam da assinatura do secretário de Planejamento Ricardo Pinheiro Penna, do Corregedor Distrital Roberto Giffoni, do secretário de
Estado de cada pasta (José Geraldo Maciel e José Luiz da Silva Valente) e de funcionários graduados (Gibrail Nabih Gebrim, Adailton Barreto Rodrigues, Masaya Kondo, Luiz Cláudio Freire de Souza França), além da homologação expressa de Arruda. Os pagamentos feitos às empresas eram controlados por Arruda e Durval Barbosa.

O Núcleo de Arrecadação de Propina e Distribuição entre os membros da quadrilha se reunia com Durval Barbosa, Omézio Pontes, Marcelo Toledo, Marcelo Carvalho de Oliveira, Domingos Lamoglia de Sales Dias, Luiz Paulo Costa Sampaio, Fábio Simão, Gibrail Nabih Gebrim, Adailton Barreto Rodrigues, Masaya Kondo e Luiz Cláudio Freire de Souza França. A atribuição era receber a propina dos representantes das empresas, no momento mais próximo à data do pagamento da prestação de serviços pelo GDF, no exato valor correspondente ao percentual sobre o valor pago. Durval Barbosa centralizava todo o comando da ação, por meio do controle e recebimento de cada pagamento de propina.

O Núcleo Gestor de Apoio Político e de Pagamento de Parlamentares e Representantes de Partidos Políticos era integrado por Durval Barbosa (por certo período), José Geraldo Maciel, Omézio Pontes, Domingos Lamoglia e Fábio Simão. A função era de auxiliar os líderes da quadrilha a
conquistar apoio político de parlamentares distritais e representantes de partidos políticos. Além disso, o núcleo pretendia evitar a fiscalização legislativa da atuação do governo.

Por fim, o Núcleo de Tarefas Gerais era formado por Marcelo Toledo Watson, Rodrigo Diniz Arantes e Luiz Paulo Costa Sampaio. A ocupação era simples: transportar a propina arrecada e cumprir tarefas gerais de interligação entre os membros.

Relação de Denunciados

1. Durval Barbosa Rodrigues
2. Benedito Augusto Domingos
3. Maria Cristina Boner Leo
4. Eurides Brito da Silva
5. José Geraldo Maciel
6. Fábio Simão
7. Ricardo Pinheiro Penna
8. Leonardo Moreira Prudente
9. Roberto Eduardo Ventura Giffoni
10. Omézio Ribeiro Pontes
11. Benício Tavares da Cunha Melo
12. Gibrail Nabih Gebrim
13. Rubens César Brunelli Júnior
14. Luiz Cláudio Freire de Souza França
15. Rodrigo Diniz Arantes
16. Luiz Paulo Costa Sampaio
17. Marcelo Toledo Watson
18. Marcelo de Carvalho Almeida
19. Nerci Soares Bussanra
20. José Celso Gontijo
21. Alexandre Tavares de Assis
22. Paulo Octávio Alves Pereira
23. Alessandro Queiroz
24. Francisco Tony Brixi de Souza
25. Gilberto Batista de Lucena
26. Domingos Lamoglia de Sales Dias
27. Adailton Barreto Rodrigues
28. José Roberto Arruda
29. Antônio Ricardo Sechis
30. Roney Tanios Nemer
31. José Luiz da Silva Valente
32. Aylton Gomes Martins
33. Odilon Aires Cavalcante
34. Rogério Ulysses Teles de Mello
35. Pedro Marcos Dias (Pedro do Ovo)
36. Berinaldo Pontes (Berinaldo da Ponte)
37. Masaya Kondo